Aí, o papai e a mamãe
decidem ter o segundo filho.
Ter dois filhos significa,
entre outras coisas, ter dois irmãos dentro de casa. No meu caso, duas irmãs – e
com uma diferença de pouco mais de dois anos entre a mais velha e a mais nova.
Talvez isso não faça muita diferença para o futuro papai que foi filho único.
Mas quem já dividiu o quarto, a barriga da mamãe e aquele pacote de biscoitos
roubado da cozinha com outro ser que possui mais de 99% do seu DNA sabe muito
bem do que eu estou falando.
O irmão é um eterno caso
de amor mal resolvido na vida um do outro. É ele quem te ensina a lidar com os
sentimentos mais nobres e mais desprezíveis da alma humana. O irmão é aquele
que te inspira a mais doce e sincera ternura por ser alguém que divide contigo
o mesmo pai, a mesma mãe, o mesmo sobrenome e, muitas vezes, o mesmo lugar no
sofá da sala. Também é quem te faz despertar para o mais vil e repulsivo dos
ciúmes exatamente por ter que dividir contigo o mesmo pai, a mesma mãe, o mesmo
sobrenome e, muitas vezes, aquele disputado lugar no sofá da sala – “sai de cima dessa almofada e me devolve o
controle remoto senão eu te esfolo vivo!”
O irmão é o seu inimigo
mais íntimo.
É o amigo com quem você
mais briga e faz as pazes.
É alguém que você não quer
ver nunca mais, mas morre de saudades quando fica distante. Com ele você
aprende a amar e odiar ao mesmo tempo uma só pessoa, sem estar casado com ela.
É pau para toda obra. É
pano para manga.
É quem vai te defender na
escola durante a juventude.
Seja mais novo ou mais
velho.
É quem vai estar ao seu
lado na hora de dar risada e quem vai te oferecer um lenço se for preciso
enxugar as lágrimas.
E, no futuro, é quem vai
compartilhar contigo as lembranças do passado. Quando ninguém mais se lembrar
delas, a não ser ele.
Até esse ponto, acho que
todo mundo concorda.
O difícil é explicar tudo
isso para as duas baixinhas, enquanto elas se atracam no tapete do quarto
porque o sorvete de uma tem mais cobertura que o da outra. O máximo que você
vai conseguir, nessa situação, é um chute na canela ou uma mordida no
antebraço. E não se engane. Antes que você possa gritar a mamãe por socorro,
elas já terão feito as pazes e estarão rolando de rir pelo chão afora. E o
sorvete de chocolate todo derretido sobre o tapete.
Vida que segue, parceiro.
E como não há outra coisa
a ser feita, o jeito é se preparar para enfrentar as infinitas crises de ciúmes
que ainda virão pela frente. Não importa que a boneca da filha mais nova seja
absolutamente idêntica à da filha mais velha. Elas sempre encontrarão um jeito
de começar uma discussão porque o cabelo de uma tá assim, o vestido da outra tá assado...
E lá vai o superpai separar mais uma briga. Faço isso pelo menos dezenove vezes
por dia com minhas duas princesas lutadoras.
Mas no fundo eu sei que elas
se amam.
Desde a primeira vez em
que se viram.
A Liz chegou da
maternidade toda embrulhadinha na manta de tricô e a Lara logo veio correndo
para ver a novidade. Ajudou a preparar o berço, dar o banho, trocar a fraldinha
e a fazer o curativo no cordão umbilical. Então, saímos eu e ela do quarto para
que a mamãe pudesse amamentar a mais nova moradora da casa.
- Gostou da sua irmãzinha,
Lara? – perguntei.
- Gostei – respondeu ela,
sem muita convicção.
Um minuto de silêncio e a
danada emendou em seguida:
- Gostei... Mas a que
horas ela vai embora, papai?