segunda-feira, 25 de março de 2024
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domingo, 20 de agosto de 2023
IRMÃOS: VALE A PENA TER O SEGUNDO FILHO?
Aí, o papai e a mamãe
decidem ter o segundo filho.
Ter dois filhos significa,
entre outras coisas, ter dois irmãos dentro de casa. No meu caso, duas irmãs – e
com uma diferença de pouco mais de dois anos entre a mais velha e a mais nova.
Talvez isso não faça muita diferença para o futuro papai que foi filho único.
Mas quem já dividiu o quarto, a barriga da mamãe e aquele pacote de biscoitos
roubado da cozinha com outro ser que possui mais de 99% do seu DNA sabe muito
bem do que eu estou falando.
O irmão é um eterno caso
de amor mal resolvido na vida um do outro. É ele quem te ensina a lidar com os
sentimentos mais nobres e mais desprezíveis da alma humana. O irmão é aquele
que te inspira a mais doce e sincera ternura por ser alguém que divide contigo
o mesmo pai, a mesma mãe, o mesmo sobrenome e, muitas vezes, o mesmo lugar no
sofá da sala. Também é quem te faz despertar para o mais vil e repulsivo dos
ciúmes exatamente por ter que dividir contigo o mesmo pai, a mesma mãe, o mesmo
sobrenome e, muitas vezes, aquele disputado lugar no sofá da sala – “sai de cima dessa almofada e me devolve o
controle remoto senão eu te esfolo vivo!”
O irmão é o seu inimigo
mais íntimo.
É o amigo com quem você
mais briga e faz as pazes.
É alguém que você não quer
ver nunca mais, mas morre de saudades quando fica distante. Com ele você
aprende a amar e odiar ao mesmo tempo uma só pessoa, sem estar casado com ela.
É pau para toda obra. É
pano para manga.
É quem vai te defender na
escola durante a juventude.
Seja mais novo ou mais
velho.
É quem vai estar ao seu
lado na hora de dar risada e quem vai te oferecer um lenço se for preciso
enxugar as lágrimas.
E, no futuro, é quem vai
compartilhar contigo as lembranças do passado. Quando ninguém mais se lembrar
delas, a não ser ele.
Até esse ponto, acho que
todo mundo concorda.
O difícil é explicar tudo
isso para as duas baixinhas, enquanto elas se atracam no tapete do quarto
porque o sorvete de uma tem mais cobertura que o da outra. O máximo que você
vai conseguir, nessa situação, é um chute na canela ou uma mordida no
antebraço. E não se engane. Antes que você possa gritar a mamãe por socorro,
elas já terão feito as pazes e estarão rolando de rir pelo chão afora. E o
sorvete de chocolate todo derretido sobre o tapete.
Vida que segue, parceiro.
E como não há outra coisa
a ser feita, o jeito é se preparar para enfrentar as infinitas crises de ciúmes
que ainda virão pela frente. Não importa que a boneca da filha mais nova seja
absolutamente idêntica à da filha mais velha. Elas sempre encontrarão um jeito
de começar uma discussão porque o cabelo de uma tá assim, o vestido da outra tá assado...
E lá vai o superpai separar mais uma briga. Faço isso pelo menos dezenove vezes
por dia com minhas duas princesas lutadoras.
Mas no fundo eu sei que elas
se amam.
Desde a primeira vez em
que se viram.
A Liz chegou da
maternidade toda embrulhadinha na manta de tricô e a Lara logo veio correndo
para ver a novidade. Ajudou a preparar o berço, dar o banho, trocar a fraldinha
e a fazer o curativo no cordão umbilical. Então, saímos eu e ela do quarto para
que a mamãe pudesse amamentar a mais nova moradora da casa.
- Gostou da sua irmãzinha,
Lara? – perguntei.
- Gostei – respondeu ela,
sem muita convicção.
Um minuto de silêncio e a
danada emendou em seguida:
- Gostei... Mas a que
horas ela vai embora, papai?
quarta-feira, 27 de abril de 2022
quinta-feira, 8 de abril de 2021
Minha Filha disse um Palavrão!
Nunca tive problemas com
palavrões.
Problemas de ordem moral,
quero dizer.
Jamais tive o menor pudor
de dizer porra, merda ou caralho e, para
ser sincero, até acho que o palavrão tem sua hora e vez numa conversa informal.
Aliás, um palavrão bem empregado pode ser mais eficiente que uma descrição de
mil palavras, sob o ponto de vista da comunicabilidade. Ou você duvida que um
sonoro puta que pariu possa
substituir prontamente uma infinidade de explicações longas e tediosas quando
tudo à nossa volta dá errado?
Pois é.
Era exatamente isso o que
eu pensava até ouvir minha filhinha de dois anos dizer seu primeiro
palavrãozinho.
Já passava da hora de dormir
e a pivetinha se recusava a subir para o quarto. Pulava no sofá, brincava com
as bonecas e corria pela sala a toda energia de suas pilhas alcalinas. Nada a
fazia parar. Com muito custo, a mamãe já exausta conseguiu convencê-la a
aceitar a mamadeira e seguir o caminho da cama. A baixinha, então, deu uma
trégua na correria e passou a caminhar com os passinhos arrastados e sonolentos
rumo à escada. Foi quando, ao subir no primeiro degrau, ela se deu conta de que
havia esquecido sua boneca favorita largada pelo chão. Aí, a mocinha entregou a
mamadeira de volta à mamãe e saiu pisando fundo na direção do brinquedo, não
sem antes deixar escapar um inesperado e estrondoso:
-
Putapaliu!
O papai fez o que pôde
para conter a gargalhada.
A mamãe o fuzilou com o
rabo do olho.
Quarenta minutos depois.
A filha finalmente dormiu
e a esposa agora desce as escadas, furiosa. O homem já preparado para a
inevitável discussão.
- Tá satisfeito agora? –
dispara ela contra o marido.
- Como?
- Não se faça de
desentendido!
- Foi o palavrão, né? Não
foi incrível? Ela nem sabe o que significa, mas já conseguiu inseri-lo num
contexto inteiramente adequado às circunstâncias. Como é espertinha essa
garota...
- E você ainda debocha?
- Ora, vamos... Diz que
não foi engraçado?
- Nem um pouco.
- Pelo jeito, a
maternidade tirou seu senso de humor.
- E a paternidade deve ter
tirado seu senso de responsabilidade. Quantas vezes já lhe falei para não dizer
palavrão na frente da menina?
- Ah, corta essa! Você
sabe que eu até tento me controlar, mas quando vejo já escapou o bendito...
- Sei...
- E também tem o seguinte:
cedo ou tarde ela ia acabar aprendendo essas coisas mesmo.
- Só que não precisava ser
tão cedo. Nem dentro de casa.
- Ai, ai...
- E eu pensando que ela só
fosse aprender isso quando estivesse na escolinha. Mas, pelo jeito, é ela quem
vai ensinar às outras crianças.
- Querida, isso não é o
fim do mundo...
- Não, é só uma puta falta de educação.
- Opa! Acho que ouvi um
palavrão!
- Ouviu nada! Eu disse puta com significado de muita.
- E puta não é palavrão?
- Seria em outro contexto.
- Ah, certo.
- Que foi? Ninguém é
infalível não!
- Então você admite que
também fala palavrão?
- Nem fodendo, falo porra
nenhuma.
Estudos científicos
revelam que os palavrões surgem no sistema límbico, que é mais ou menos o porão
do cérebro, uma zona mais primitiva de nossa mente que, na maior parte das
vezes, é inibida pelo pensamento consciente e costuma aflorar somente quando
tropeçamos numa pedra ou quando o atacante do nosso time perde um pênalti na
final do campeonato.
Palavrões são assim mesmo.
Imprevisíveis e
incontroláveis.
Pior que dor de barriga
quando vem com tudo.
E há de se convir que eles
fazem parte da língua escrita e falada como fiel expressão de nossos
sentimentos mais íntimos. Palavrões traduzem a apoteose da liberdade
gramatical. O desatino da sintaxe. A lacuna do dicionário. A revolução do
submundo das letras. É a redenção da semântica no resgate da contracultura. E
talvez outras coisas mais.
Entretanto, reconheço que
existem pessoas cuja sensibilidade poética pode se fazer incomodada em meio às
cobras e lagartos da literatura vulgar. Nem todo mundo se sente à vontade nos
subterrâneos do idioma formal. E o fato é que estou sinceramente tentando me
corrigir. Por isso, desde já, antecipo minhas desculpas a quem achou este texto
repugnante e ofensivo.
Espero que não me leve a mal.
Ou então, foda-se!
segunda-feira, 31 de agosto de 2020
O Sexo dos Caramujos
O mundo é gay.
Foi o que me disse, certa
vez, alguém cujo nome já não me recordo. Sabe como é, a idade vai avançando e a
memória não é mais a mesma de quando era capaz de dizer a escalação do Brasil
de 94 de cor. Hoje mal me lembro da dupla Bebeto e Romário. Tinha ainda o
Taffarel, o Dunga... E outros nomes me vêm à cabeça, mas já não sei se eram
jogadores da seleção ou meus colegas de primário. O fato é que o mundo está
ficando cada vez mais gay – o que é ótimo sob vários aspectos.
A liberdade de expressão
foi elevada a seu expoente máximo, permitindo que todos manifestem publicamente
suas preferências sexuais num carnaval de liberdades que dura o ano inteiro,
mesmo fora da Bahia. Todos são livres para escreverem o que pensam na linha do
tempo do facebook e postarem suas selfies fazendo pose no espelho. Abaixo
a repressão moral! E qualquer comentário debochado ou preconceituoso é impiedosamente
condenado ao repúdio coletivo e à execração nas redes sociais.
Tudo isso é maravilhoso,
mas pode causar certos embaraços.
Fico pensando, por
exemplo, na situação daquele pai e daquela mãe que estão decidindo o nome do bebê.
Como fazer a escolha certa sem saber se, no futuro, aquela criança irá assumir
uma opção sexual coincidente com a sua anatomia? Talvez fosse o tempo de se
atualizar o registro civil para fazer constar duas alternativas na certidão de
nascimento: um nome oficial para o sexo presumido e um nome reserva para o
plano B – a escolha seria do próprio interessado ao completar dezoito anos.
Assim, Sansão poderia se tornar Dalila, João poderia se tornar Joana e Juraci
poderia ficar do mesmo jeito, pois tanto faz.
Engraçado que esse assunto
me faz recordar a história do sexo dos caramujos, que li, anos atrás, não me
lembro mais onde – minha memória anda mesmo péssima, ainda bem que tem o google para uma pesquisa de última hora
que confira um mínimo de credibilidade a este texto. Como eu ia dizendo, certos
tipos de caramujos trocam de sexo ao longo da vida. Isso mesmo. Trata-se de um
engenhoso mecanismo evolutivo que amplia as chances de sobrevivência da
espécie, na medida em que cada organismo carrega dentro de si os gametas masculino
e feminino. Na prática, o caramujo nasce macho, torna-se fêmea após algum tempo
e passa a maior parte da vida nessa condição, voltando a ser macho pouco antes
de morrer. É um dos poucos animais que vive a experiência da sexualidade em sua
plenitude. Só não imagino a dificuldade para os papais caramujos escolherem um
nome que combine com seus filhotes diante dessa multivariedade sexual....
O fato é que, após muito
refletir, enfim cheguei a uma conclusão. Os caramujos ainda não sei, mas se eu
tiver um terceiro bebê, vou batizá-lo de Ariel. Aí, quando ele crescer, vai
poder decidir se quer ser homem, mulher, sereia ou marca de sabão em pó.
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