(Este texto é parte integrante do livro Pai de Menina: Bem-vindo ao Mundo Cor de Rosa, de Eduardo Buzzinari)
- É menina! – disse a médica do ultrassom.
Tudo começou assim. E de que outro jeito haveria de ser?
O
certo era que essas duas palavras mudariam a minha vida para sempre.
Era
uma manhã ainda fresca do mês de janeiro, quando entramos na clínica médica
para a terceira ultrassonografia: a que revelaria o sexo do bebê.
Dezesseis
semanas de gestação.
Tinha
sido um custo esperar tanto.
Antes
disso, é claro que já havíamos lançado mão de outros expedientes menos
científicos na tentativa de descobrir se esperávamos por um menino ou por uma
menina. Não foi Shakespeare quem disse que há mais coisas entre o céu e a terra
do que supõe nossa vã filosofia?
Não
custava arriscar, afinal.
Começamos
pelo teste da colher e do garfo. A mecânica era extremamente simples:
escondia-se um garfo e uma colher, cada qual sob uma almofada diferente, e
pedia-se para a futura mamãe se sentar sobre uma delas. Colher era menina e
garfo era menino. Deu Garfo.
Passamos,
então, ao método da soma (que, embora calcado em sólida sustentação matemática,
havia sido extraído da internet, como o anterior). Assim, somamos a idade da
gestante ao mês da fecundação e reduzimos o resultado obtido a um só algarismo.
Deu par. Menino de novo.
O
teste da aliança foi igualmente categórico. A aliança de ouro amarrada a um fio
de cabelo se moveu como um pêndulo sobre a barriga da mamãe. Nada de círculos.
E menino outra vez.
Na
sequência, fizemos a prova da idade lunar, tabela chinesa e medição da
frequência cardíaca (putz, como tem porcaria na internet...). O resultado?
Menino, menino e menino sem dúvida.
-
Barriga pontuda – disse uma tia sensitiva da minha esposa – É menino na certa!
Pode encomendar a chuteira de futebol.
Aí,
o futuro papai ficou todo bobo.
E
já começou a fazer planos de comprar a camisa do time de coração, ler para ele os
velhos quadrinhos de super-heróis, assistir juntos a filmes de aventura e até
tomar leite achocolatado na cadeira de papinha falando das meninas do berçário.
Afinal
de contas, tantas teorias empíricas de credibilidade insuspeita não poderiam
estar enganadas ao mesmo tempo. Ainda mais se endossadas pelo palpite infalível
daquela tia sensitiva. Barriga pontuda, ela disse. Não tem erro!
Aí,
veio o dia do ultrassom.
Na
noite anterior, eu havia sonhado com uma menininha. Estranho... A sala de
exames toda decorada de florzinhas também podia ser uma mera coincidência do
acaso. O papel de parede cor de rosa por detrás do monitor, outro tanto.
Mas
a tela em preto e branco do aparelho, essa não.
(apesar
de eu não ter entendido nada daquelas manchas e borrões que se supunham minha
filha)
- É
menina! – disse a médica do ultrassom.
E a
ciência derrubou a certeza de todas aquelas lendas populares num só golpe.
Um,
dois, três, quatro... Dez!
Vitória
por nocaute.
Na
lona, restaram os mitos desfeitos e o pai da menina atropelado por uma manada
de elefantes.
A
futura mamãe logo se apressou em buscar o rosto do marido para saber qual seria
sua reação, mas os olhos dele estavam vidrados numa outra dimensão. A tela do
ultrassom imediatamente tomou a forma de um trilho de montanha-russa numa
descida vertical de cento e vinte metros. O carrinho onde o pai acabara de
embarcar deu um estalido seco e despencou a uma velocidade de zunir os ouvidos
para emendar três loopings seguidos e
parar de cabeça para baixo.
-
Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh...
Só
conhece essa sensação quem já andou numa montanha-russa cujo carrinho deu
defeito no ponto mais alto de uma curva em trezentos e sessenta graus e quem é
pai de menina. Muitos dos quais garantem que estão de cabeça para baixo até hoje.
E
foi assim que vi aquela chuteira de futebol se transformar numa linda sapatilha
de balé.
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Excelente leitura! Recomendo!
ResponderExcluirQue lindo! Adorei!
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